Michelle


Michelle, 1 metro e 82, braços fortes. Cabelos longos e gordurosos.
Peito torto e farto, silicone industrial mal aplicado com agulha veterinária e cola superbonder.
É homem e se diz mulher.
Caminha nas madrugadas da avenida Brasil próximo à praça Raposo Tavares da antiga rodoviária.

Vem a noite. transborda. preenche de maneira lenta&rápida os pontos claros do dia que vai desistindo de existir.
O espaço continua o mesmo, mas se transforma.
Outros ares, outros bichos, mesmos interesses.
Aqueles que durante o dia dormiam embaixo de marquises, caixas, escadas, becos, pessoas que se escondem em quartos de hotéis baratos, locais que os queridos maringaenses com seus cheiros de cinza e formol ignoram e evitam imaginar.
Madrugadas em que o senhor genko e granado dormem em seus lares requintados rodeados por grades, guardas e latidos.
A lua cai, permanece dura&firme olhando para esses belos seres,
e na Brasil só resiste o que é dela.

Michelle é da(o) Brasil.

Aquele cara que você vê de longe e sabe que vai lhe pedir um cigarro. chega perto. com aquelas tetas tortas, oferta-se. você ignora. ela baixa pra dez. você recusa.

Atravessa as avenidas como uma caçadora, corre. para. anda. gira. ergue os braços, arruma o cabelo, grita.
Os carros fumaceando pela avenida passam atentos a atuação.
Nisso, eu,
sentado em frente a uma porta de lata de uma possível loja de eletros-domésticos junto a um sem teto viciado em crack recém chegado de londrina chutado por sua dita companheira.
Penso observar tudo no meu dia a dia,
na minha rotina de universitário medíocre, analisando as categorias, os conceitos, trabalhando a objetividade, formulando novas ideias. mas talvez não vejo é nada.

Todos que passam me enchem o saco e pedem cigarro,
divido vinho com aquelas bocas que não sei por onde passaram e nem o que um dia, ou mesmo há pouco, tocaram.



Michelle não toma banho há três dias. Seu rosto com pele seca tem lá seus trinta e cinco anos, bigode chinês, sobrancelha fina mal feita com pelos apontando pelos cantos.

Quando ainda é dia e o sol no céu olha para a Brasil essas mesmas pessoas não estão em caixões feito vampiros, estão por aí,
sem chance,
sem futuro,
sem esperanças nem lutas por nada além da sobrevivência e buscas de escapes de toda essa merda que os rodeiam.
Por mais que pareça.. não querem,
diferente do maringaense,
o sangue seu, meu, de ninguém.
querem é que o padre e o policial na hipocrisia de cada um não os encha o saco e os deixem viver cada qual a sua maneira.

Levanto, deixo um cigarro ao jorge. o sem teto, sem rumo, sem futuro, que tem uma das pernas fina&torta,
não fina como as minhas,
mas sim como um graveto
um cabo de vassoura deformado. eu vou, ele fica.
mais uma noite em que ira cavoucar a terra e procurar as alturas afogando-se no crack.


Subindo pela avenida, entre a catedral e a praça, passa por mim uma hilux.
No banco ao lado do motorista a imagem é conhecida.
1 metro e 82, braços fortes, cabelos longos e gordurosos,
peito farto e torto, bigode chinês e sobrancelha mal desenhada,
três dias sem banho,
ela(e), Michelle, acompanha alguém.
talvez o padre ou o policial para não sei onde, com o objetivo de satisfazer desejos nunca colocados à luz do dia, à luz da bela cidade canção
que geme chora grita.

6 comentários:

  1. aew Henrique!!! ow muito bom o texto to esperando por mais, vo acompanha o site agora >D....vlw ai flw

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  2. POra velho eu ia passar só pra agradecer o comentário no blog, mas meu fiquei de queixo caído com os níveis do texto (destaque para o "Michelle")

    muito bom cara

    abço

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  3. Rapaz, que fotografia da noite Má-ringaense.
    Lembro uma vez, quando precisei dormir num hotel barato (aquele atrás do São Francisco, perto da Brasil), por, outra vez, ter esquecido a chave de casa em algum banco ou loja - só no outro dia...: Acordei três horas da manhã assustadíssimo, briga de travecos, cafetas e pedreira...
    Fiquei da janela escutando. Acabou o quebra-pau, dos que ficaram, compadecido, desci pra tomar uma com eles, pois o sono tinha ido embora com o estardalhaço.

    Belo retrato mesmo, Mr.

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  4. essa é a literatura urbana que o joão antônio tanto queria!
    felizmente levaram pra frente as idéias dele e as michelles têm holofotes nas maringás pseudo-literárias.

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  5. ai Zizo muito LOKO a michelle!!!!
    mais a do fede barros é a melhor

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